Restaurante mantém receitas seculares e ensina fazer língua flambada - veja vídeo
Mirella Duarte

A tradição cuiabana é mantida em algumas comunidades pelos costumes e linguajar, nas artes e, principalmente, dentro de algumas cozinhas. Entre os elogios mais tecidos à Capital, a comida é a que recebe mais enamorados. Parte dessa preservação segue de geração em geração e atrai turistas curiosos por séculos, por ser tão específica e original.
Rodinei Crescencio

Fachada de restaurante tradicional da cuiabania, é um dos únicos que mantém as receitas tradicionais no cardápio há pelo menos duas décadas na Capital
Influências como a indígena, portuguesa, espanhola e africana são as mais perceptíveis, principalmente após o “isolamento” que a Baixada passou tendo que se nutrir com o que era ofertado nos rios e suas terras após a Guerra do Paraguai.
O Restaurante Regionalíssimo é um dos únicos que mantém as receitas tradicionais no cardápio há pelo menos duas décadas através da família Biancardini. Antes, o restaurante era localizado em um anexo da Casa do Artesão, mas hoje segue no interior do Museu do Rio, antigo Mercado do Peixe, no Porto. A marca foi criada pela ex-primeira-dama Isabel Campos (falecida), esposa de Julio Campos, e queria preservar a comida regional.
“Meus avós eram italianos e franceses, mas nossa família se estabeleceu aqui e temos essa tradição”
Proprietário Jean BiancardiniO restaurante, após alguns anos sob sua administração, foi tendo menos repercussão, mas a família Biancardini teve a oportunidade de revigorar o público.
“É uma marca própria nossa e há 14 anos estamos na orla. Meus avós eram italianos e franceses, mas nossa família se estabeleceu aqui e temos essa tradição”, comenta Jean Biancardini, 65 anos, o patriarca da família e proprietário.
Rodinei Crescencio

Língua de boi flambada ao molho. O toque especial vem da cachaça que flamba a língua
Antes de chegarem os clientes para o almoço, única refeição servida ao dia de segunda a domingo, a mesa segue posta com inúmeras receitas famosas como filé de pintado, peixe frito, peixe ensopado com mandioca, carne seca com banana, mojica de pintado ou os carros chefes da casa como paella Cuiabana, vatapá cuiabano e a língua de boi flambada na cachaça, que o chef de cozinha preparou no passo para o - veja o vídeo abaixo.
“A comida cuiabana tem uma variedade enorme de receitas, aqui reunimos 30 delas e os turistas chegam sedentos e ficam apaixonados pela nossa comida. No entanto, os cuiabanos lotam nosso restaurante todos os dias”, conta Jean.
A língua de boi é também uma receita secular muito feita em Mato Grosso, inclusive em Cuiabá. A carne era considerada nobre por ter pouca demanda em cada abate de boi. Mesmo que em grandes festas de fazenda fizessem outras preparações, a língua era uma das mais disputadas.
Na receita ensinada pelo cozinheiro do Regionalíssimo, o toque especial vem da cachaça que flamba a língua com uma garrafa de Jamel, bebida muito popular entre os mais tradicionais – entre a variedade de aguardentes no mundo, a cachaça é peculiar por ter sido inventada no Brasil. Usada para amaciar a carne de porco, o nome também foi “grapa” azeda, tinha o nome pronunciado pelos africanos que a faziam a bebida (através da produção de açúcar) como “cagaça”.
Na mesa do dia, além dos ensopados, fritos e toda comida salgada, uma mesa farta de sobremesa mostra doces feitos também com ingredientes da terra como o furrundu, a paçoca de pilão e outras delicadezas culinárias. “O que é tradicional deve ser mantido para ser lembrado e um povo que não tem memória não tem história. Alguns dizem que é mesmice, mas é esta mesmice que dá certo. Se eu sair dela, perdemos a identidade da comida local”, acredita o cuiabano Biancardini - confira a galeria da mesa abaixo.
“O que é tradicional deve ser mantido para ser lembrado e um povo que não tem memória não tem história”
Proprietário Jean BiancardiniA antiga arquitetura do espaço
Com a criação do Arraial de Bom Jesus de Cuiabá em 1827, o Porto tornou-se centro de carga e descarga dos produtos que abasteciam a região. O local era um dos mais populosos até então e a socialyte imigrante, coroa e nativos transitavam com frequência pelo local. Além deles, proprietários das usinas de açúcar, das companhias de navegação e os comerciantes de maior poderio financeiro da Capital.
Na estrutura onde hoje se fixa também o Regionalíssimo, na época foram estabelecidos comércios. O espaço é cercado de casarões coloniais, com um espaço dedicado o Liu Arruda, ao Museu do Rio “Hid Alfred Scaff”, ao Aquário Municipal, ao Mercado do Porto, a Casa do Artesão, as Igrejas São Gonçalo e Nossa Senhora Auxiliadora e ao antigo cais do porto.