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Segunda-Feira, 22 de Outubro de 2007, 22h:08 | Atualizado: 26/12/2010, 12h:19
Cultura em pé de guerra
A calmaria no meio cultural rompeu-se. Duas matérias jornalísticas turvaram as águas. Uma - Estado gasta mais de R$ 2 mi em concertos - encontra-se na RDNews (12/10), na qual, é resumido o conteúdo da Portaria n. 48, emitida pela Secretaria de Cultura. Por aquele dispositivo, são destinados R$ 2,1 milhões para 68 apresentações de concertos públicos e didáticos da Orquestra de Câmara de MT. Assim, até março/2009, Cuiabá e mais 34 cidades assistirão aos espetáculos. A Secretaria objetiva "fomentar e potencializar a música popular e erudita, possibilitando a sociedade em geral o acesso às artes".
A outra matéria - Tem polêmica à vista - foi veiculada no Diário de Cuiabá (14/10). Sua essência versa sobre o conteúdo do Projeto de Lei (PL) n. 149/2007, assinado pelos Deputados Riva e Rabelo. A discórdia está no 4º par., no qual se lê: "Os projetos (culturais) apresentados deverão promover a contratação de artistas locais de MT,sendo vedada a contratação, com recursos provenientes do Fundo Estadual de Fomento à Cultura, de artistas de outros Estados". Visando à proteção de artistas locais, o artigo impõe a lógica abominável da reserva de mercado. À defesa disso, saiu a Ordem dos Músicos/ MT, representada por um deles. No mais, só ataque; até o Secretário de Cultura de Cuiabá condenou o PL. Um dos artistas lembrou que "...a cultura é livre, não tem raça, religião ou fronteira".
Dessa lembrança, vejo que o cerne da discussão não se restringe ao ataque à reserva de mercado. Sei disso por meio de dois e-mails que recebi de integrantes de um fórum cultural. Por esses, pressinto que o representante dos Músicos não fala sozinho ou apenas pela Ordem. Em um dos e-mails, a matéria da RDNews - acima referida - foi-me enviada com o seguinte comentário: "Que maravilha"; grafado com maiúsculas e seguido de exclamações.
Esse conjunto sígnico tem dupla interpretação, podendo ser de concordância ou não com tudo que está na matéria. Se for, o que direi a partir de agora deve ser desconsiderado. Se não for, o enunciado, pretendendo ser irônico, diz o oposto da essência do que está enviando. Contudo, nesse caso, opor-se, sem identificar exatamente a que está se opondo, parece-me trazer mais problemas que soluções. Como já disse, a matéria da RDNews trata do dispositivo legal (portaria) que destina recursos à Orquestra, o que possibilitaria a realização do conteúdo musical em si. Por isso, nesse caso, ao se comentar a portaria, é prudente separar as coisas; juntando-as, podem-se engrossar vozes desafinadas.
Como cidadão, refuto os dispositivos antidemocráticos; porém, isso não me permitiria atacar o trabalho da Orquestra. Pelo seu competentíssimo desempenho e pela lógica pública e didática presentes nos concertos eu só posso desejar que os recursos necessários sejam garantidos. Portanto, minhas considerações estão fora da discussão do campo legal para o orçamento; estou discutindo no campo do conteúdo/qualidade.
Agora, a verdade é que, com a criação da Orquestra, além de aumentar a disputa pelos recursos, o nível cultural subiu de tom. Isso exige melhor qualidade de outras manifestações. A qualidade da Orquestra é tão inegável que nem o melhor do regional é desprezado; ganha roupagem de câmara. Se ouvir um tradicional rasqueado já era digoreste(i), agora, ficou ainda mais fino.
No outro e-mail que recebi - salvo erro de interpretação- seu remetente, em que pese oponha-se à política feita por portarias e ressalva não ter "Nada contra os músicos, orquestra etc...", ao comentar, indiretamente, a mesma matéria da RDNews, disse, brincando com a palavra "evento", que o trabalho da Orquestra "...é vento. Cultura do morango no bolo. Só serve para abrilhantar festas..." Fez mais: incitou os músicos da Ordem a questionarem se só há músicos de MT na Orquestra. Tal incitação, mesmo não pretendendo, engrossa o coro das vozes que defendem a reserva; afinal, os curricula dos músicos da Orquestra são conhecidos. Quase todos são oriundos de outros locais do Brasil e do mundo. No mais, dizer que a Orquestra é "cultura do morango no bolo" é um desafino que machuca demais os ouvidos. A cultura não merece isso.
Roberto Boaventura da Silva Sá é doutor em Ciências da Comunicação/USP e professor da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT)
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